A pobreza bate-nos cada vez mais à porta, e entra-nos pelos olhos, pelos ouvidos, pela vida a dentro.
Não falo de mim. Temos tido a sorte de continuar a ter emprego, e nada nos falta. Mas são tantos os casos de desemprego à nossa volta, tantas pessoas a passar realmente mal...
No outro dia, fui ao supermercado aproveitar umas promoções. Fui comprar cereais chocapic com 50% em cartão (que são os que o marido normalmente come) e farinhas alimentares (das já preparadas para a máquina do pão) com 25% em cartão - ambos em quantidade, para aproveitar os descontos. Pelo meio, como de costume, ainda trouxe mais uma cosinha ou outra. Convencida de que estava a fazer uma boa poupança (e estava, pelo nosso padrão), encontrei um lugar numa fila.
À minha frente, estava uma senhora, de idade indefinida no rosto cansado, 30 e poucos, 30 e muitos, ou até quarenta, talvez? Vestida de modo simples. Com poucas compras na passadeira - tudo bens alimentares essenciais, de marca branca, e um único luxo: um coelho de chocolate, para a Páscoa de alguma criança.
Perguntou-me que dia era. Respondi. O seu rosto mostrou a desilusão, enquanto amarfanhava o talão de 10% de desconto que expirara na véspera. Contou o dinheiro na carteira, com cuidado. Perguntou à menina da caixa, ansiosa, se não tinha dinheiro no cartão, que devia ter - e sabia bem exatamente quanto. A menina respondeu que só se via o valor depois da conta feita. Volta a remexer no porta-moedas. Tira de lá uma nota de 5. Pergunta se pode usar o desconto da gasolina - mas a compra não chegava aos 20€, por cêntimos. Escolheu, com algum tempo, as pastilhas elásticas mais baratas (0,65€) para arredondar a compra e poder usar o tal desconto. Depois de descontar o que tinha no cartão, faltavam 6€ e picos. E eu a observar a ansiedade daquela senhora, que só queria alimentar a família, e que claramente, por uns cêntimos a mais não poderia levar tudo.
Encontrou na carteira os trocos que faltavam e pagou.
O tempo todo, estive a pensar... o que me custava pagar estas compras à senhora? A ela, talvez fizesse verdadeira diferença. Estive roída, a achar que devia fazer alguma coisa, mas com receio de melindrar ou ofender, não fiz nada. De repente as minhas poupanças no carrinho pareciam-me luxos que trocaria de bom grado pela possibilidade de ajudar uma pessoa em necessidade. Ficou a pesar-me... Não sei se fiz bem ou mal em estar quieta.
P.s.: Ajudar cara a cara é complicado, sobretudo nestes casos de pobreza honesta e envergonhada, que são aqueles que mais me tocam. Mas há sempre maneiras indiretas de ajudar. A paróquia da minha zona serve refeições a muitas pessoas necessitadas, e tenho levado géneros alimentares para ajudar. Há muitas instituições credíveis através das quais podemos fazer uma pequenina diferença, à medida das nossas possibilidades. Esta semana, não quero ir de férias sem levar lá mais um saco. Mas continuo triste, caramba.
pois eu acho que faria o mesmo que tu, ficaria quieta. Acho que teria medo da reacção.
ResponderEliminaré mto triste sim, mas atenção que tbém há mta gente que não está para se sujeitar a qualquer trabalho, mas isso é outra história.
Bjo
Maggie
É algo muito triste mesmo. Penso que faria o mesmo, embora ficasse sempre preocupada como tu. Por vezes, as pessoas não reagem bem a certas ajudas, logo penso que fizeste o melhor.
ResponderEliminarObrigada, Maggie e Sofia... Fico a sentir-me menos pesada com a minha (não)decisão. Estas coisas afligem-me.
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